*Por Mário Gilberto Oliveira
Tomei conhecimento do inteiro teor da decisão cautelar proferida pelo Ministro Gilmar Mendes do Supremo Tribunal Federal, nos autos do Mandado de Segurança Coletivo nº 34.070-DF, impetrado pelo Partido Popular Socialista (PPS) contra o ato da Presidente da República que nomeou Luiz Inácio para o cargo de Ministro Chefe da Casa Civil.
qui, não faço qualquer avaliação ou emito qualquer juízo de valor sobre os princípios da legalidade, moralidade e eficiência que devem nortear o ato administrativo questionado na via mandamental, pois, estes devem ser examinados, pelo juiz ou pelo tribunal, por ocasião do julgamento da causa.Mas, a minha reflexão sobre o tema se dá, extra autos, ou seja, se refere ao cabimento do Mandado de Segurança Coletivo, para corrigir ou anular qualquer ato administrativo que implique em desvio de finalidade.
Na minha visão, o remédio jurídico correto para anular ato administrativo lesivo ao patrimônio público, à moralidade administrativa ou que implique em desvio de finalidade, se trata da Ação Popular, porque o Artigo 5º, inciso LXXIII, da Constituição Federal de 1.988 estabelece expressamente que:
“Art. 5º (…)
LXXIII – qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência.”
No caso do Mandado de Segurança nº 34.070-DF constatei que na sua decisão, o Ministro GILMAR MENDES fez um grande esforço intelectual, para justificar o cabimento do Mandado de Segurança impetrado por partido político, na defesa e proteção dos direitos difusos.
De fato, a Constituição Federal, no seu artigo 5º, LXX dispõe, expressamente, o seguinte:
“Art. 5º (…)
LXX – o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:
a) Partido político com representação no Congresso Nacional;
b) Organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados.”
Como se vê, no artigo 5º, inciso LXX da atual Constituição Federal, não se especifica em que casos a agremiação partidária poderá utilizar a ação mandamental.
Todavia, o Congresso Nacional sancionou a Lei nº 12.016, de 7 de agosto de 2009, cujo artigo 21 estabelece o seguinte:
“Art. 21. O mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por partido político com representação no Congresso Nacional, na defesa de seus interesses legítimos relativos a seus integrantes ou à finalidade partidária, ou por organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há, pelo menos, 1 (um) ano, em defesa de direitos líquidos e certos da totalidade, ou de parte, dos seus membros ou associados, na forma dos seus estatutos e desde que pertinentes às suas finalidades, dispensada, para tanto, autorização especial.
Parágrafo único. Os direitos protegidos pelo mandado de segurança coletivo podem ser:
I – coletivos, assim entendidos, para efeito desta Lei, os transindividuais, de natureza indivisível, de que seja titular grupo ou categoria de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica básica;
II – individuais homogêneos, assim entendidos, para efeito desta Lei, os decorrentes de origem comum e da atividade ou situação específica da totalidade ou de parte dos associados ou membros do impetrante.”
Tendo em vista a clareza do artigo 21, caput, da Lei nº 12.016, de 7 de agosto de 2009, não é crível que o Mandado de Segurança nº 34.070 impetrado pelo Partido Popular Socialista (PPS) tenha por finalidade a defesa de seus interesses legítimos relativos a seus integrantes ou à finalidade partidária.
Desta maneira, para se admitir o Mandado de Segurança Coletivo nº 34.070-DF, impetrado pelo PPS, perante o Supremo Tribunal Federal será necessário que a Corte, antes de tudo, enfrente a questão da constitucionalidade do artigo 21, caput, da Lei nº 12.016/2009, pois, caso conclua que se trata de uma norma que não ofende a Constituição Federal de 1.988, a iniciativa processual do Partido Popular Socialista será negado, quando do julgamento de mérito daquele remédio constitucional.
Vejam bem, o próprio Ministro Gilmar Mendes, quando participou do julgamento do Recurso Extraordinário nº 196.184-8 – AMAZONAS – naquela ocasião, ele acompanhou a Ministra ELLEN GRACE, que lavrou o Acórdão, dando provimento ao recurso interposto pelo Município de Manaus, onde o Plenário da Corte Suprema, por maioria de votos, decidiu que:
‘RECURSO EXTRAODINÁRIO 196.184-8 AMAZONAS
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
RECORRENTE: MUNICÍPIO DE MANAUS
ADVOGADO: LOURENÇO DOS SANTOS PEREIRA BRAGA E OUTRO
RECORRIDO: PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO – PSB
ADVOGADO: CÉSAR AUGUSTO SANTOS PEREIRA
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO. LEGITIMIDADE ATIVA ‘AD CAUSAM’ DE PARTIDO POLÍTICO. IMPUGNAÇÃO DE EXIGÊNCIA TRIBUTÁRIA. IPTU.
1. Uma exigência tributária configura interesse de grupo ou classe de pessoas, só podendo ser impugnada por eles próprios, de forma individual ou coletiva. Precedente: RE 213.631, rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 07.04.2000.
2. O partido político não está, pois, autorizado a valer-se do mandado de segurança coletivo para, substituindo todos os cidadãos na defesa de interesses individuais, impugnar majoração de tributo.
3. Recurso Extraordinário conhecido e provido.
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, nos termos do voto da Relatora.”
No julgamento do Recurso Extraordinário nº 196.184-8 – AMAZONAS – o Ministro Gilmar Mendes votou no sentido seguinte:
“O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES – Sr. Presidente, só à guisa de ressalva. Tenho dificuldades, com todas as vênias, para aceitar a tese esposada na primeira parte do voto da Ministra Ellen quanto a essa legitimação universal do partido político para defesa também de interesses aparentemente universais. Tenho a impressão de que a dogmática que assentamos em relação ao mandado de segurança e à estrita observância do direito líquido e certo também aqui se impõe, é claro, e com as adaptações de estilo. Tenho até a impressão de que tem sido este, pelo menos, o entendimento básico até aqui sinalizado. Não imagino que o partido político possa fazer a defesa de interesses outros que nãos os de seus eventuais filiados.
No caso, não tenho dificuldades de acompanhá-la, como já deixou claro, não se cuida de interesse defensável, ou seja, por ação civil pública ou mesmo pelo instrumento de que cuida. Mas gostaria de ressaltar a minha dificuldade em acompanhá-la, na primeira parte.”
Caso o Supremo Tribunal Federal entenda que seja cabível o Mandado de Segurança Coletivo, para corrigir ou anular todos e quaisquer atos administrativos que atentem contra os princípios da legalidade, moralidade, publicidade e eficiência (art. 37, da CF/88), que envolvam os interesses da coletividade ou direitos difusos, neste caso, não haverá dúvida, de que as atividades das agremiações partidárias, seguramente, restariam bastante ampliadas, o que seria ótimo para a população brasileira, pois, a maioria das mazelas praticadas pelos agentes públicos, com toda certeza, seriam anulada pelos próprios partidos políticos, sem que o cidadão tenha que, individualmente, bater às portas do Judiciário, para postular a reparação de um direito seu violado por decisão administrativa.
Mas, apesar da Constituição Federal, no seu artigo 5º , inciso LXX não indicar em quais casos os partidos políticos têm legitimação para impetrar o mandado de segurança coletivo, o certo é que a Lei nº 12.016, de 07.08.2009 é clara ao estabelecer no seu artigo 21, caput, que o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por partido político com representação no Congresso Nacional, na defesa de seus interesses legítimos relativos a seus integrantes ou à finalidade partidária.
Sendo assim, para que se possa admitir o Mandado de Segurança nº 34.070 impetrado pelo Partido Popular Socialista contra ato da Presidente da República, que nomeou Luiz Início como Ministro Chefe da Casa Civil, a Corte Suprema terá de enfrentar a questão da constitucionalidade ou não do artigo 21, caput, da Lei nº 12.016, de 07.08.2009, pois, na hipótese do Plenário do STJ chegar à conclusão de se tratar de uma norma constitucional, neste, caso, a ação mandamental impetrada, no mérito, será negada.
Faço este alerta porque a sociedade brasileira está em estado de ebulição e as autoridades dos 03 (três) poderes da República, lamentavelmente, não estão tendo a clareza suficiente, para o perigo que este clima de beligerância que permeia todo o corpo da sociedade representa para a nossa incipiente Democracia.
Assim, em face do atual momento em que vive a Nação brasileira, está passando da hora das nossas autoridades públicas dos três poderes buscarem restabelecer a paz social e os nossos juízes têm o dever de decidir todas as questões que lhes são postas com prudência, discrição e serenidade, pois, quando se permite que a política possa entrar pela porta da frente do Tribunal, todos tenham certeza, a Justiça irá sair pelas portas dos fundos.
Brasília-DF, 19 de março de 2016.
MÁRIO GILBERTO DE OLIVEIRA
OAB-DF 4.785