O ano de 2025 se desenha para ser um ano de grandes turbulências na política mundial. Se em 2024 o movimento das placas tectônicas da geopolítica foi extremamente intenso, 2025 dá todos os indícios que seguirá na mesma toada.
O principal fator que justifica a afirmação anterior é a chegada de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos. O republicano, que assume o posto no próximo dia 20 de janeiro, retomará, tanto quanto possível, seu projeto isolacionista e protecionista em diferentes dimensões de política externa.
Em razão disso, as disputas entre os diferentes silos de poder nos Estados Unidos se intensificarão, tendo em vista que Trump é uma figura política que não faz parte dos blocos de interesse e poder tradicionais estadunidenses.
As consequências diretas desse conflito devem se expressar de distintas maneirasno cenário internacional.
Em primeiro lugar, continuaremos a ver o Oriente Médio como o espaço privilegiado dos principais conflitos internacionais da atualidade. O projeto expansionista da Eretz Yisrael (Grande Israel)levado a cabo por Benjamin Netanyahu, já abordado por mim em artigo, aqui no Radar DF, intitulado A luta não é mais contra o Hamas.
Israel desencadeia, na verdade, um projeto político, continuará a receber o apoio político, financeiro, diplomático e militar dos Estados Unidos, país no qual o interesse israelense se expressa de maneira sólida (aconselho a leitura do livro O lóbi de Israel e Política Externa dos Estados Unidos da América, de John Mearsheimer e Sephen Walt).
Os interesses de Israel na região serão ainda mais favorecidos pela retórica agressiva que Trump provavelmente adotará na sua relação com o Irã. As ameaças e o deterioramento das relações entre EUA e Irã, inclusive com risco de guerra, serão o pretexto para que Israel, sob o argumento da necessidade de segurança, reforce ainda mais sua posição no Oriente Médio, promovendo seus objetivos de expansão política e territorial na região (vejamos o comportamento israelense quando da queda de Bashar Al-Assad).
Se os conflitos no Oriente Médio não dão sinais de conclusão, no leste europeu a Rússia caminha para a consolidação de uma posição de força militar e diplomática em relação aos ocidentais.
As repetidas declarações de Trump de que acabaria com a guerra na Ucrânia num curto espaço de tempo e sua posição relutante em alimentar o conflito por meio do envio de armamentos nos levam a pensar que o conflito está próximo do fim.
De fato, a guerra já apresenta sinais mais do que claros de seu esgotamento. Sob a presidência Trump, o conflito tende a um fim com uma vitória inequívoca de Vladimir Putin não apenas contra os ucranianos, mas contra a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), vista pelos russos como uma ameaça existencial.
O término oficial da guerra não chegará em “um dia”, como prometido pelo republicano, mas será construído ao longo de sua presidência conforme as resistências do complexo industrial-militar estadunidense, principal patrocinador do conflito, sejam superadas e a imagem dos Estados Unidos como um país não-derrotado seja preservada.
Uma terceira tendência da política internacional é o agravamento dos conflitos comerciais internacionais e da disputa tecnológica sino-estadunidense. Se, durante a presidência de Joe Biden, os noticiários de política internacional eram ocupados com o assunto “guerra na Ucrânia”, a tendência é que a guerra tecnológico-comercial entre China e Estados Unidos volte ao centro do palco, principalmente a partir da resolução diplomático-militar do conflito russo-ucraniano.
Mesmo que a disputa tecnológica-comercial nunca tenha se esvaído durante a administração Biden, a linguagem não-agressiva do democrata resultou na pouca atenção dada às medidas protecionistas por ele adotadas. Com Trump, cuja retórica é injuriosa, possivelmente voltaremos a nos concentrar, nos 4 anos de sua administração, no eixo de conflito China-Estados Unidos em detrimento daquele com os russos.
A posição protecionista e isolacionista do republicano também terá efeitos nas estruturas de governança internacional. Pouco tempo depois de sua posse, em fevereiro de 2021, Joe Biden anunciou que “Americaisback” (A América está de volta), referindo-se ao retorno dos Estados Unidos aos principais órgãos de concertação internacional e marcando uma diferença em relação ao primeiro mandato de Trump.
Com Trump de volta à Casa Branca, a “América” também está de volta, só que desta vez para dentro de casa. Observaremos, assim, um esvaziamento ainda mais intenso dos mecanismos de concertação internacional ocidentais (sobretudo ONU e a OTAN), o que intensificará uma tomada de posição nacionalista e de autossuficiências econômica, tecnológica e militar por parte dos principais aliados da superpotência americana.
Como resultado dessa dinâmica, vivenciaremos uma disputa pelos vácuos de poder entre as potências internacionais, notadamente entre os europeus e o bloco liderado por China e Rússia, além de presenciarmos um avanço ainda mais intenso das estruturas internacionais contestadoras da ordem internacional ocidental, tal qual os BRICS+.
Os interesses dos países que compõem a cena internacional, difusos por natureza, e as dinâmicas de cooperação e conflito que se desenham no mundo contemporâneo serão essenciais na definição dos rumos da geopolítica no ano que se inicia.
Parafraseando Gramsci, as estruturas do velho mundo estão a morrer, ao mesmo tempo, em que as estruturas do novo mundo ainda não surgiram.
Quanto tempo esse novo mundo demorará para realmente nascer, não sabemos, mas as mudanças que vemos se dão a passos largos.