No meu último texto, tratei sobre as reais intenções do governo de Israel com o conflito na Palestina e busquei desconstruir a gritaria generalizada que foi produzida no Brasil após as declarações do presidente Lula, em sua última viagem à África, a respeito das ações militares israelenses em Gaza.
Pouco depois da publicação de meu último texto, novas atrocidades em Gaza foram divulgadas, sendo a mais notável delas o ataque realizado pelas Forças de Defesa de Israel contra centenas de Palestinos que buscavam desesperadamente alimentos nos caminhões de ajuda humanitária.
Dada a dimensão da brutalidade das ações de Israel na faixa de Gaza, não poderia me dedicar a outro tema nesta semana que não ao massacre vivido pelos palestinos.
Um dos principais pontos levantados por mim no meu último artigo dizia respeito à utilização, por parte do governo de Benjamin Netanyahu, dos ataques do Hamas como pretexto para intensificar a política de ocupação territorial e colonização da Palestina, cuja execução precede (e muito!) os ataques do último 7 de outubro.
De fato, essa política, que em outros momentos históricos foi conduzida sem muito alarde e sem conhecimento da grande massa da população mundial, passou a ser parte integrante não apenas da prática, mas, também, da retórica do chefe de governo israelense, quem afirmou recentemente, referindo-se às ações militares israelenses na região, que “a Palestina nunca mais será a mesma”.
Além da intensificação retórica, também medidas jurídicas têm sido adotadas. A aprovação recente, por parte do Parlamento de Israel, do texto da moção proposta por Benjamin Netanyahu, segundo a qual Israel rejeita a criação de um Estado palestino como solução permanente para o conflito, reforça o ânimo belicoso dos israelenses e fortalece a posição política extremista de seu primeiro-ministro.
Dadas as ações do governo israelense na faixa de Gaza e a política de destruição dos palestinos, quem, segundo Netanyahu, sequer podem ser considerados humanos, a posição internacional de Israel caminha ainda mais para um isolamento internacional, o qual se reflete não apenas nas altas esferas da política internacional, como demonstrou a uníssona declaração do G-20, no último dia 22 de fevereiro, em favor da criação do Estado Palestino, mas, também, no seio da população mundial.
De fato, as atrocidades cometidas por Israel chamam cada vez mais a atenção da sociedade mundial e trazem à tona questionamentos de ordem moral e ética a respeito das ações dirigidas pela classe política israelense.
Diante do que expus acima, trago alguns questionamentos que nos convidam a pensar se aquilo que faz o governo israelense em Gaza pode ainda ser justificado como uma ação militar sob pretexto de defesa.
Quantos inocentes palestinos ainda precisarão ser completamente massacrados em Gaza para que o governo de Israel declare finalmente sua intenção de acabar com as hostilidades militares?
A vida de um palestino tem menos valor que a vida de qualquer outro ser humano que esteja na face da terra, de modo que o massacre indiscriminado seja justificado?
Será realmente que a política de insuflar o conflito armado é a melhor opção para a segurança dos próprios Israelenses que se encontram, inclusive, mundo afora?
Será que Israel é realmente capaz, como declara,de acabar com o Hamas ou somente está produzindo mais rancor, ódio e ressentimentos numa população que se encontra subjugada agora e que pode alimentar um sentimento de ódio e vingança no futuro?
Não estaria o governo de Netanyahu garantindo um problema futuro para o povo israelense ao sair completamente da linha do aceitável no seu dito “direito de resposta e de defesa” aos ataques do Hamas do último 7 de outubro?
As respostas aos questionamentos acima dificilmente são diferentes entre os leitores, a despeito das diferenças de opinião política que venham a ter. O bom-senso e o equilíbrio somente podem nos levar à conclusão de que o governo de Israel promove um massacre sem proporções para atender aos objetivos políticos e territoriais de uma classe política extremista que se aproveita do sofrimento de seu próprio povo para justificar ações desmedidas e completamente desproporcionais contra uma população que já vive em estado de miséria e privações das mais diversas há anos.
Diante disso, parece-me que deveríamos começar a tratar a questão do conflito em Gaza não mais como uma resposta militar de Israel para garantir sua segurança e de sua população face ao risco que o Hamas e outros grupos de libertação da Palestina lhe impõem.
A análise deve centrar-se, agora, no fato de que Israel, por meio de uma coalizão governamental extremista, deslancha um projeto político que visa à ocupação territorial, ao controle de recursos naturais da região de Gaza, ao aumento do poder na balança geopolítica regional de poder e, como objetivo mais imediato, à sobrevivência de seu primeiro-ministro no poder, quem enfrentava, até antes dos ataques do Hamas, queda na aprovação e uma encurralada judicial em razão de sua tentativa de reformar o judiciário israelense no ano de 2023.
A esperança de que o projeto acima apresentadotenha parada forçada se assenta quase que exclusivamente sobre um ator internacional: Estados Unidos. Estes são o único país que reúne os meios diplomáticos, militares e de influência sobre Israel para efetivamente brecar a implementação deste projeto político e, consequentemente, o massacre dos Palestinos em Gaza.
Uma atitude mais assertiva dos estadunidenses parece ser construída em torno dos objetivos eleitorais do Partido Democrata, o qual teme que a condução diplomática da crise no Oriente Médio tenha repercussões no resultado das eleições nos Estados Unidos no próximo 5 de novembro, retirando os democratas da Casa Branca.
A situação é, portanto, de extrema complexidade, já que a sorte dos palestinos e do equilíbrio de poder no Oriente Médio subordina-se à atuação de um país cujos laços com Israel são estreitos.
Enquanto não se abre completamente a janela de oportunidade para que o massacre contra os Palestinos cesse, cabe a nós a denúncia contínua e persistente das reais intenções de um governo extremista que coloca em xeque não somente a segurança de milhões de palestinos, mas, também, a curto e longo prazos, a segurança de seu próprio povo, o qual já sofre com ataques de outros grupos que se colocam contra a política de Netanyahu e que, num futuro não distante, muito provavelmente enfrentará o rancor, ódio e sentimento de vingança de uma população que hoje é massacrada.