|Por Lauro Assunção||RADAR-DF
Pena que aqui não haja espaço para descrever as inúmeras agressões de que a Polícia Militar vem sendo vítima, não apenas da bandidagem que lhe compete reprimir, mas, o mais grave, de alguns setores da Justiça e da imprensa, bem como das ONGs defensoras de grupos anárquicos ou de criminosos comuns, sob o pretexto de serem estes “vítimas da sociedade”.
O fato é que, de repente, muitas autoridades passaram a achar glamouroso atacar a Polícia Militar, tachando-a de violenta, enquanto bandos de celerados ousam, pela atrocidade, subtrair o sossego, o patrimônio e até mesmo a vida dos cidadãos. 60 mil mortos por ano é o saldo dessa escalada.
Ainda que tenhamos perdido a capacidade, ou o ânimo, de defender os valores da civilização, convém ao menos cuidarmos de nossas instituições, e a Polícia Militar precisa ser preservada em sua plenitude, vez que é ela que viabiliza as demais autoridades e, assim, a nossa vida em sociedade.
E foi por isso que, entre outros casos, muito me chocou a forma como um juiz de direito de São Paulo, no recente episódio do Centro Paula Souza, revelou enorme desprezo pela Polícia Militar, esquecendo-se de que, não fosse a existência daquela força de policiamento ostensivo, ele não teria condições nem mesmo de proferir sua decisão, pois não só o mandado restaria inexequível, mas, sobretudo porque não existiria papel ou meio eletrônico para que ele pudesse exarar o seu despacho.
Aliás, sem a existência da Polícia Militar, não teríamos Poder Judiciário, Parlamento ou Executivo. E na linha das advertências de Thomas Hobbes, cuja obra inspira cada palavra deste texto, diria mesmo da impossibilidade de existir indústria, agricultura, comércio, medicina, lazer, imprensa ou educação.
Ou seja, não existiria a vida civilizada, rica e prazerosa nos moldes que a conhecemos hoje, e sim a barbárie, uma existência miserável, amedrontada e curta, quer pela violência, quer pela fome, quer pela doença.
LEIA MAIS:
Em seis dias, Rio de Janeiro tem cinco policiais mortos e três feridos; mas ninguém liga
Policiais vão para guerra, choram, morrem… mas a sociedade não se indigna
É verdade que Thomas Hobbes usou seus fortes argumentos para pregar o nada simpático absolutismo, o Leviatã, um grande clássico na história das ideias.
Todavia, ao mostrar a inviabilidade do convívio social sem um poder intimidador que levasse o indivíduo a respeitar a lei, findou por nos conscientizar da benéfica renúncia de parte da nossa liberdade como algo essencial ao funcionamento da sociedade.
Mas também é verdade que ele, ao pregar a necessidade do poder coativo do soberano para o estabelecimento da obediência, da paz e da prosperidade dos povos, deixou de dar ênfase ao principal componente dessa equação: a força militar.
As gendarmarias, a nossa atual Polícia Militar, cuja origem remonta aos guardas dos celeiros que, há 10 mil anos, na Mesopotâmia, garantiram a invenção da agricultura e o surgimento das primeiras civilizações. De lá para cá, foi o policiamento ostensivo que permitiu viabilizar a extraordinária jornada do Homo sapiens até nossos dias.
Diferente de Rousseau, que introduziu a idealização teórica do “bom selvagem” como um ser humano bem formado por natureza, Ian Morris, em sua recente obra intitulada “Guerra”, apoia-se nos estudos de Azar Gat para sustentar que na Idade da Pedra as pessoas viviam em sociedades pequenas e hostis, com uma vida curtíssima, sendo que uma entre cinco sucumbia por homicídio.
E embora haja teóricos a contradizer a natureza agressiva do Homo sapiens, a arqueologia vem revelando fortes sinais de violência do homem desde seu momento caçador-coletor.
A violência dos assírios, a história das tribos bárbaras, matando e saqueando umas às outras, bem como o massacre dos tutsis dão pistas do que seria nossa vida de desassossego e ineficiência sem o policiamento ostensivo de que hoje dispomos.
E ao passar as vistas pelas lutas de expansão dos impérios da antiguidade aos nossos dias, pela escravidão no Brasil e sua conexão com as lutas das tribos africanas, que saqueavam, escravizavam e vendiam os rivais vencidos, tudo isso demonstra a forte propensão do homem a espoliar e subjugar o semelhante.
É a lei, sem dúvida, que nos faz civilizados. Mas que força teria a lei se não existisse a polícia para obrigar o seu cumprimento?
Ora, se não houvesse um grupo numeroso e bem armado de policiais com a honrosa missão de domar a violência e proteger os cidadãos, dando-lhes paz e segurança para se dedicarem à produção e circulação de bens e serviços, as demais instituições restariam inúteis.
Seríamos presas fáceis diante de bandos numerosos a agredirem homens e mulheres buscando saciar seus apetites.
Mas os agredidos também se organizariam em facções para se defender e ir à forra. Seria o homem em seu cruel estado de natureza. Seria “a guerra de todos contra todos”.
Teríamos, assim, uma vida miserável, uma situação em que não existiria lei nem propriedade, e as pessoas só teriam o que pudessem tomar de outro, “pelo tempo que conseguissem conservar”. Viveríamos em bandos armados, propensos a aniquilar ou sermos aniquilados a qualquer instante.
No dia em que as pessoas tiverem a devida consciência da imprescindibilidade da Polícia Militar e, sobretudo, do caos decorrente de sua ausência, certamente dedicarão aos seus membros a louvação e a reverência nos mesmos níveis que se têm pela nossa Suprema Corte, por exemplo.
Exorto, assim, as autoridades a revelarem maior apreço pela nossa Polícia Militar, servindo de exemplo aos demais cidadãos. Se não por homenagem aos policiais e suas viúvas, que seja, então, por homenagem às famílias brasileiras que deles dependem, inclusive as das próprias autoridades soberbas.
*Lauro Assunção é administrador de empresas e bacharel em direito.
Você precisa fazer login para comentar.