Diante de um contexto de acirramento das disputas energéticas globais e das preocupações sobre segurança energética, Brasil sedia evento internacional mais importante do ano sobre as mudanças climáticas.
O começo das discussões internacionais sobre as mudanças climáticas na 30ª edição da Conferência das Partes (COP) em Belém-PA, sob liderança brasileira, marca um importante momento da agenda climática internacional.
Sob chefia do embaixador Corrêa do Lago, a presidência brasileira elegeu para esta COP a necessidade de financiamento e a ação concreta internacionais para combater as mudanças climáticas como os dois pontos mais importantes de discussão da conferência.
A despeito da agenda positiva e ambiciosa da presidência brasileira, as discussões da 30ª edição da COP se dão num contexto de acirramento das disputas geopolíticas energéticas internacionais.
A COP30 fará frente, portanto, a duas problemáticas principais que podem ser freios para seu êxito: (i) a resistência dos países desenvolvidos em direcionar mais recursos aos países em desenvolvimento para o financiamento de ações e projetos de transição climática e (ii) as divergências em torno do conceito de “segurança energética” no mundo de hoje.
O impasse do financiamento
Desde a Conferência de Estocolmo de 1972, países ricos e pobres alimentam desacordos sobre o uso de recursos naturais e sobre o papel que as nações subdesenvolvidas e desenvolvidas deveriam exercer no combate às mudanças climáticas.
A época de Estocolmo 1972, países ricos defendiam que os países pobres deveriam preservar os recursos naturais e o meio-ambiente, enquanto os países pobres advogavam a necessidade de utilizar tais recursos para seu desenvolvimento socioeconômico interno.
Desde então, as discussões sobre as mudanças climáticas evoluíram sobremaneira e hoje é consenso universal que se fazem necessárias as transições ecológica e energética em todos os países do mundo de modo a evitar o colapso planetário.
Não obstante essa percepção comum, as divergências entre desenvolvidos e subdesenvolvidos ainda subsistem no plano do financiamento. Para os países pobres, o financiamento desta transição deve ser suportado majoritariamente pelos países ricos, cuja responsabilidade nas emissões globais de CO2 é mais acentuada e cujo nível de desenvolvimento permite um aporte financeiro de maior monta.
Para os países ricos, a palavra de ordem é “resistir” a todo e qualquer tipo de compromisso que lhes implique transferência de recursos para a transição climática sem que haja uma contrapartida dos subdesenvolvidos para a exploração dos recursos naturais.
Neste aspecto, pois, que se produzem os atritos entre ambos os grupos, porquanto os interesses e as visões sobre o processo de transição divergem.
Segurança energética nacional
Além das divergências sobre o financiamento da transição climática, as diferentes noções de “segurança energética nacional” constituem um verdadeiro empecilho para o êxito das negociações da COP30.
Cada país tem uma percepção distinta sobre o papel que os governos, a sociedade civil e os setores financeiro e produtivo nacionais devem ter na passagem para uma economia descarbonizada.
Ademais, as matrizes energéticas de cada nação são distintas e, por essa razão, diferentes restrições de ordem social, política e econômica se impõem a cada país. Esta multiplicidade de realidades, atores, interesses e percepções torna uma coordenação efetiva em nível internacional torna quase impossível.
Nos Estados Unidos de Donald Trump, a ordem do dia é perfurar poços de petróleo tanto quanto possível. O Estado chinês, por outro lado, aposta numa eletrificação em massa da vida para reduzir o impacto de carbono das atividades econômicas na atmosfera, o que é simbolizado pelo domínio global dos carros elétricos chineses.
Para um país como a Índia, assumir compromissos relevantes em matéria de descarbonização da economia é muito custoso, porquanto cerca de 73% de sua matriz energética provém do carvão. Para o Brasil, por outro lado, os custos econômicos e sociais de uma transição seriam provavelmente muito menores, pois que cerca de 80% provêm de fontes renováveis.
Os exemplos acima ilustram a dificuldade de se criar consensos em torno da velocidade de implantação e da forma com que deve ocorrer a transição energética. Diante das diferentes restrições e interesses de cada país, as posições e compromissos assumidos são subordinados aos objetivos econômicos e geopolíticos de curto e médio prazos.
A estabilidade é privilegiada em detrimento da mudança e aquelas mudanças, necessárias, que se advogava “urgentes”, ficam em segundo plano.
Diante das duas problemáticas que aqui abordei, as negociações da COP30 refletirão essa dinâmica de interesses nacionais. De um lado, as principais potências internacionais buscarão salvaguardar sua segurança energética. Do outro, os países subdesenvolvidos condicionarão seu lançamento na descarbonização da economia ao financiamento provido pelos países do centro da economia internacional.
A COP de Belém contribuirá para sedimentar as bases de um entendimento internacional futuro acerca do caminho a ser seguido por nações subdesenvolvidas e desenvolvidas na resolução da crise climática global.
*Caio Rafael Corrêa Braga é Internacionalista. Pesquisador na Amarante Consulting. Morou e estudou na França, Itália e Alemanha. Atualmente, encontra-se em Berlim e é colunista exclusivo do Radar DF.


