O professor doutor-doutor Carlos Alberto Decotelli, abre a porta para os notáveis, na Esplanada dos Ministérios, já entreaberta com a chegada, semana passada, do deputado Fábio Faria (PSD/RN), na pasta das Comunicações.
Esse modelo seria a “ponte para o futuro” do governo Jair Bolsonaro, ou, ainda, uma “tábua de salvação”, segundo outros observadores.
A ideia seria recompor o gabinete ministerial com nomes vigorosos e de amplo trânsito para revigorar a força política do governo como um todo. Essa é a fórmula do “Ministério de Notáveis”.
Novo fôlego
Nesse processo, o presidente da República assumiria uma outra imagem e ganharia novo fôlego. Esse modelo foi adotado em 1992, numa tentativa para salvar o governo do ex-presidente Fernando Collor, que despencava sob a acusação midiática de corrupção e, efetivamente, de isolamento no Congresso.
Foram chamadas figuras de grandes trânsito e respeitabilidades políticas para os cargos-chave: Jorge Bornhausen (PFL/SC) para a Secretaria de Governo, o diplomata de carreira e banqueiro Marcílio Marques Moreira para a Economia, e o jurista, ex-parlamentar e ex-ministro Célio Borja para o Ministério da Justiça.
As nomeações foram muito bem aceitas, porém chegaram tarde. O presidente foi deposto.
Operações Desestabilizadoras
Segundo as narrativas informais, a mudança de rumo na escolha dos novos ministros seria obra dos dois principais ex-chefes militares transbordados para a política, o vice-presidente Hamilton Mourão e o general Eduardo Villas Boas, assessor especial no Gabinete de Segurança Institucional (SGI).
O objetivo seria reforçar a chamada ala técnica do Ministério, afastando as áreas de atrito com os demais poderes. A passagem do general de divisão Luiz Eduardo Ramos para a reserva é outro movimento a ser observado.
Com isto, o governo ganharia uma sobrevida para enfrentar sem mais traumas institucionais o período pós pandemia e chegar inteiro às eleições de 2022. Ou seja: botar a presidência num respiradouro.
Reforma ministerial
Ministério de Notáveis é uma expressão inventada pelo então governador do Distrito Federal, Paulo Octávio, em 1889, para tentar salvar seu governo, que logo passou para seu aliado Fernando Collor, ideia bem aceita, mas que não chegou a tempo.
Entretanto, todos os presidentes, desde a República Velha, usaram a reforma ministerial como instrumento para reagrupar suas forças políticas. O Brasil independente nasceu numa reforma ministerial, quando, logo depois do Dia do Fico, em janeiro de 1822, o príncipe regente, D. Pedro de Alcântara, deu um cavalo-de-pau no ministério que lhe deixara o pai, Dom João VI, chamando um novo gabinete liderado pelo patriarca da Independência José Bonifácio de Andrada e Silva, readquirindo as forças que lhe permitiram mandar de volta à Europa as tropas portuguesas estacionadas no Rio de Janeiro e que ameaçavam seu governo.
O ministério de notáveis trazia grande nomes de São Paulo para substituir um gabinete formado por sumidades portuguesas. Foi o primeiro governo inteiramente com brasileiros natos. Ou seja, essa ideia vem de longe e, muitas vezes, funcionou.
Nomes bem recebidos
Os dois ministros, Decotelli e Faria, foram recebidos com indulgência pela mídia, o que é um bom sinal para o sucesso do projeto.
É claro que os jornalistas, em sua maioria hostis ao governo, sempre soltam cascas de banana. Faria é associado a seu sogro, o dono da Rede de Tv SBT, Silvio Santos (ele é casado com a filha do astro, Patrícia Abravanel – pessoa com luz própria como profissional do ramo).
Na verdade, o ministro é um veterano deputado, com trânsito em todos os segmentos políticos, inclusive na esquerda parlamentar; Decotelli é um educador renomado, reconhecido nos meios acadêmicos e na fauna educacional (tanto de esquerda como de direita), mas lhe pegam no pé dizendo ser ex-militar, o que não é verdade, quando deixou as Marinha aos 22 anos.
A seu favor, nestes tempos de protesto mundial contra o racismo norte-americano e com a imagem do Brasil derretendo na área black, sua cor pode ser usada como um lenitivo, embora o novo ministro não tenha construído sua imagem nem fundamentado sua biografia nas questões identitárias.
Mas serve para o gasto e, certamente, será utilizado pelos marqueteiros para aliviar o tiroteio em cima das demais críticas que estão abalando a imagem do País no Exterior.
Deixar como está
O fim imediato do governo Bolsonaro não é bem visto na comunidade de negócios e tem restrições nos meios políticos. Os danos da pandemia e a instabilidade econômica inerente a um impeachment desaconselhariam operações desestabilizadoras.
Já os políticos veem no impeachment a subida do vice-presidente Mourão, que poderia, muito provavelmente, vencer uma reeleição em 2022.
Estes acreditam que é melhor deixar como está, dando panos à crise econômica e contar com a impermeabilidade política do presidente para abrir novos espaços a candidaturas conservadoras menos radicais.
A esquerda não participa dessas formulações, embora a Frente Ampla deva acolher vários segmentos, haja vista a participação dos ex-candidatos Fernando Haddad, do PT, e Guilherme Boulos, do PSOL, no frentão em torno do manifesto intitulado Direitos Já.
*José Antônio Severo é jornalista e autor de vários livros como
Rios de Sangue, Os Senhores da Guerra e Cinzas do Sul